Buracos-de-Minhoca no meio (de) “Interestelar”
Algum tempo atrás falei sobre alguns filmes que envolviam ciência, mais especificamente física, de maneira séria. Se você não está morto deve saber que hoje haverá a estréia do novo filme do Christopher Nolan, o assim chamado “Interestelar”. O trailer é esse aqui
A estória do filme gira em torno de que em um futuro próximo a Terra está morrendo/expediente-narrativo-conveniente de modo que a humanidade precisa arrumar outro planeta habitável. Isso não é importante. O importante é que como as estrelas mais próximas ainda assim estão muito distantes se faz necessário um outro meio de chegar até o tal planeta habitável de forma rápida. E esse meio é um buraco-de-minhoca, um quase literal buraco no próprio espaço e tempo que conecta duas regiões distantes do universo, do mesmo modo que, em teoria, o trajeto mais curto do Brasil ao Japão é um buraco pelo meio do planeta. A diferença é que o universo não está contido em um “espaço maior”, então o buraco-de-minhoca não é um túnel através de nada, ele é simplesmente uma região de espaço conectando outra região de espaço de forma que se você fizer um laço passando pelas duas aberturas do buraco-de-minhoca não vai conseguir diminuir o tamanho da corda arbitrariamente como conseguiria se fizesse o laço no meio do sistema solar, por exemplo.
“Mas Cesar”-ouço você dizendo-“essa é a coisa mais estúpida que já li no seu blog, esse será só mais um filme onde ciência=mágica trocando abracadabra por ponte de Einstein-Rosen“. Mas não desta vez meu caro leitor(a). Se você for no IMDb do filme vai ver entre os produtores executivos um tal de Kip Thorne. Duas coisa interessantes sobre esta pessoa: sim, Kip é o primeiro nome dele de verdade e ele é um físico teórico que está entre os principais nomes da “era de ouro da Relatividade Geral”, junto com o Roger Penrose e o Stephen Hawking, de quem é amigo pessoal e colaborador. Também foi um dos maiores responsáveis pelo LIGO, um detector de ondas gravitacionais, ter saído do papel e estar hoje em busca de suas primeiras detecções.
Há mais ou menos uma década o Kip e a Lynda Obst, uma produtora americana, tiveram uma idéia de fazer um filme cientificamente preciso, mas mais importante que isso onde a ciência tivesse um papel de destaque. A idéia de fazer uma ficção com essa restrição atraiu o Spielberg para dirigir, que trouxe o Jonathan Nolan para fazer o roteiro. No final, por questões corporativas, o Spielberg saiu do projeto e o Christopher Nolan entrou de diretor. Como o Preskill conta no blog dele, no final o roteiro do Kip e da Lynda foi muito modificado, mas o conceito do filme permaneceu.
O quão longe eles levam esse conceito no filme? Bom, o Kip Thorne se juntou com a empresa de efeitos visuais e ao invés de explicar como um buraco negro se parece ele levou as equações da relatividade geral para que eles simulassem a matemática usando o CG. Ficou mais ou menos assim:
O que está nessa imagem? Como já expliquei antes, um buraco negro é uma região do espaçotempo que está tão deformada, ou curvada mais tecnicamente falando, que a luz que passa nessa região não consegue mais sair. Então se nenhuma luz sai do buraco negro ele é só uma região negra em que não vemos nada, a esfera no centro da imagem. Mas isso não é tudo, imagine agora que uma estrela passe perto do buraco negro. Se ela chegar perto o suficiente, uma distancia chamada limite de Roche, a força gravitacional do buraco negro vai destruir a estrutura da estrela e transformá-la em pó, formando um círculo de poeira ao redor dele, exatamente como os anéis de Saturno, mas nesse caso chamado disco de acreção.
A diferença é que se o buraco negro estiver rodando essa poeira acelera muito, e consequentemente esquenta muito? E o que acontece quando pegamos um material e deixamos ele bem quente. Dica: olhe para o teto. Exatamente, ele emite luz como uma lâmpada. É por isso que tem um anel brilhante no plano horizontal da imagem. Mas e o halo no plano vertical? Ali não tem nada, é só uma miragem!
Sabe como num dia de calor você vê uma imagem borrada do carro no pavimento da rua? Obviamente não tem um carro dentro do asfalto, é só o fato que o calor altera o índice de refração do ar de modo que a luz que reflete do carro e sai em direção ao chão passa pelo ar quente que agora atua como uma lente e curva o raio de luz, este agora indo na sua direção. Mais ou menos a mesma coisa acontece no buraco negro. A gravidade é tão forte que curva os raios de luz emitidos pelo disco de acreção. Então o halo vertical que você vê é a luz emitida pela parte do disco atrás do buraco negro. Os raios de luz emitidos verticalmente são curvados e direcionados até o lugar onde está se observando o buraco negro. Por mudar a direção do raio de luz como se esse tivesse passado por um instrumento ótico é que chamamos esse efeito de lentes gravitacionais. Não só buracos negros, como outros objetos massivos também tem lente gravitacionais observáveis, até mesmo o Sol, e essa é uma técnica astronômica muito utilizada atualmente para encontrar tais objetos massivos, incluindo aqui possíveis buracos-de-minhoca.
Mas eu divago. O que você talvez tenha lido é que as imagens de CG são geradas não baseadas em conceitos artísticos, mas nas próprias equações da relatividade geral, as mesmas que eu estudo diariamente. Então ao ver aquela imagem acima você está de fato aprendendo relatividade. Tão preciso é o filme em relação a física que o Kip Thorne vai publicar artigos sobre coisas que ele descobriu com a ajuda do CG. Então no filme aparecem os retratos mais realistas de buracos negros jamais feitos. Certo?
Err, não exatamente. A imagem acima é um buraco negro com disco de acreção feita por Jean-Alain Marck na década de 90, baseado no trabalho pioneiro de Jean-Pierre Luminet. Embora em menor resolução a imagem é feita mais ou menos da mesma perspectiva, e dá para notar que é bem diferente do que aparece no filme. Em particular ela é bem assimétrica. Isso porque, conforme o próprio Kip Thorne já afirmou, em email ao Prof. Luminet, na produção do filme eles acabaram desconsiderando certos efeitos na formação da imagem, como o efeito Doppler, para não confundir a audiência.
“Então o filme não é 100% realista, não é tão fiel a ciência como a propaganda afirma” você diz. Veja bem, sabe como na física da escola é comum nos exercícios aparecer a frase “desprezando a resistência do ar”? Significa que ao desprezar efeitos que sabemos estar lá nós não estamos sendo realistas, e portanto a física em nível escolar está errada?
Essa visão vem do nosso relacionamento disfuncional com a ciência. Essa, como a arte, não tem como objetivo apenas retratar o mundo como é, mas nos permitir entendê-lo e assim se relacionar com ele. Quando dizemos que desprezamos certo efeito, a resistência do ar na escola ou o efeito Doppler no filme, o que queremos comunicar é que estamos nos focando em um aspecto da realidade para melhor entendê-lo, do mesmo modo que um quadro de van Gogh nos permite entender, e assim dialogar, com um aspecto da realidade, ainda que ele não seja um retrato fidedigno do que os olhos vêem
Com isso quero expressar minha esperança de que o filme será o cientificamente mais preciso já feito, com as qualificações acima, e que seja interessante de assistir. Basta que a audiência tenha a postura correta.
E para quem tiver curiosidade o Kip Thorne lança amanhã um livro sobre a física do filme. Também dele, e excelente leitura, é o “Black Holes and Time Warps“. Além disso quero deixar a promessa de explicar qualquer parte da física do filme que alguém quiser entender melhor, é só deixar um comentário aqui embaixo após assistir. Apenas lembre de colocar um alerta de spoilers para não incitar ódio coletivo. Enquanto isso pode dar uma olhada nesse vídeo sobre o CG do buraco negro
PS: Sim eu sei, não falei nada da física dos buracos-de-minhoca e você está “xingando muito do twitter” que eu uso títulos sensacionalistas só para ter mais visualizações. Para reiterar, um buraco negro não é de modo algum um buraco de minhoca, não é possível por nada no mundo. Esse texto falou do primeiro para esclarecer o quão cientificamente acurado é o filme. Com relação ao segundo, to aqui estudando sobre os buracos-de-minhoca mas ainda não entendi que tipo exatamente deve aparecer no filme. Quando eu aprender mais e conferir no filme exatamente qual a idéia central eu faço um post novo só sobre isso.
ai que legal 🙂
gostei.
Gostaria de sua opinião sobre o filme. Acha que funciona para despertar interesse na ciência? Cometeu erros grosseiros?
Felipe,
ainda não consegui ver o filme, é uma das desvantagens de se morar no interior paulistano. Mas tenho esperanças de ver no próximo fim de semana. De qualquer modo já posso responder a primeira parte: dado que teve bastante publicidade em torno do filme acredito que já serviu para despertar um interesse em ciência. A segunda parte respondo assim que o assistir. Nesse meio tempo ficarei feliz de tirar dúvidas sobre aspectos do filme, desde que não envolva nenhum spoiler
O filme fala bastante sobre relatividade. Poderia dar uma breve explicação sobre como se relaciona o aumento da velocidade, com o campo gravitacional e a dilatação do tempo? Sei que o observador que se move nas velocidades próximas a da luz, teria seu tempo dilatado em relação a um observador que se move com velocidade muito inferior. Mas como isso se relaciona com o campo gravitacional que também influencia o tempo?
Eu falei um pouco disso no post sobre buracos negros que está linkado no post acima. Você chegou a dar uma olhada? De qualquer modo a idéia é que quanto mais perto de um objeto massivo, como um buraco negro, mais devagar o tempo passa em relação a quem está longe. Quando você se move em relação a outra parece que o tempo da outra pessoa passa mais devagar, mas essa relação é recíproca, quem está “parado” acha que quem está se movendo é que tem o tempo mais devagar, o que não é o caso no campo gravitacional. De qualquer modo quando estamos nos movendo em um campo gravitacional aparecem os dois efeitos, o da gravidade e o do deslocamento, e a passagem do tempo depende do movimento em si. Mas o que acho importante enfatizar no caso do filme é que a dilatação temporal devido ao objeto massivo é um efeito distinto daquele atribuído ao movimento, e no filme o que importa é a ação da gravidade, não o deslocamento.
Gostaria de parabeniza-lo pela coerencia e tambem lhe fazer uma pergunta. Gostaria de lhe perguntar quanto a visao dimensional que o protagonista tem em relacao ao quarto da filha, o mesmo poderia ver e agir em um evento do passado? Tem relacao com a materia escura ou super- cordas? Desde ja agradeco.
vankley,
ainda não assisti, espero conseguir fazer isso nesse próximo fim de semana. Mas posso garantir que nada no filme tem alguma conexão com matéria escura, pois ela se comporta de maneira usual do ponto de vista gravitacional. Também nunca vi a teoria de supercordas ser relevante no contexto que o filme se insere, mas após ver o filme volto aqui para explicar a cena que você descreve. Para não ficar vindo aqui toda hora é só deixar um comentário de volta e clicar no “avise-me sobre novos comentários por email” que quando eu responder você já recebe
vankley,
desculpe a demora. Ver eventos do passado não são problema. Essencialmente o hipercubo (eu presumo) funciona como uma filmadora, ele registra todos os eventos passados e deixa o Cooper passar pelos frames para frente e para trás. Note que o Cooper em si não viaja no tempo em momento algum. Essencialmente o filme deixa implícito que não podemos voltar no tempo, apenas mandar informações na forma ondas gravitacionais para o passado. Com relação a isso é verdade que existem soluções na relatividade geral que permitem mandar informação para o passado, inclusive usando buracos negros. No entanto tudo indica que isso não é possível. O Hawking inclusive tem um artigo sobre algo chamado Conjectura da Proteção Cronológica. Basicamente a idéia é que quando tentamos fazer uma máquina do tempo o vácuo, de acordo com a mecânica quântica, adquire tanta energia que ele mesmo destrói a máquina do tempo antes mesmo de ela ser construída. Não há nada em teoria de cordas que poderia evitar essa conclusão do meu ponto de vista. Assim acredito que embora não tenhamos prova, é muito provável que exista uma lei da natureza que impeça alguém de enviar mensagens para o passado. Nesta parte do filme temos que dar a liberdade artística ao diretor e fingir que estamos ok com isso
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Cesar, lendo o livro, para mim não ficou claro a relação entre o spin do buraco negro tornar possível a distorção de tempo de 1 horas = 7 anos no planeta Miller. No livre, o autor diz que é necessário o spin para tornar possível essa exigência do roteiro, mas não entendi. Se ele não tivesse o spin, e o planeta continuasse próximo ao horizonte de eventos, a distorção temporal seria menor por que?
Mercutiu, antes de tudo queria dizer que fico feliz que até personagens de Shakespeare tenham interesse em física. Quanto a relação, a necessidade do spin, é razoavelmente simples. Um buraco negro tem uma atração gravitacional tão forte que existe uma região fora do horizonte de eventos onde, não importa quão rápido você orbite, a gravidade sempre ganha e te puxa mais para perto do horizonte. Nessa região não tem como existir nenhum planeta, pois qualquer órbita ali é instável, qualquer perturbação te joga para dentro do buraco negro. No caso de BN sem rotação a órbita mais próxima que é estável fica a uma distância de 3 raios do buraco negro. Por exemplo, um BN com a massa do Sol tem mais ou menos 3km de raio, então nesse caso a menor órbita estável fica a 9 km do centro do BN, ou a 6 km do horizonte. Essa distância é tão grande que o efeito da distorção temporal seria muito pequeno, acho que uns 10-12 minutos. A diferença para o caso do spin é que quanto mais rápido gira um buraco negro, mais perto do horizonte de eventos fica a menor órbita estável. Por isso que no livro o Thorne fala que precisa de um spin enorme, quase o máximo suportado pelo buraco negro. Desse modo o planeta pode ter uma órbita estável bem próxima do horizonte de eventos, e quanto mais próximo do horizonte maior é a distorção temporal. Assim se ele não tivesse o spin o planeta não poderia ficar tão próximo ao horizonte sem cair nele eventualmente. Se você tem o livro ele explica um pouco da estabilidade das órbitas nas páginas 173-175.
Cesar, morri de rir com seu comentário sobre o personagem shakespeariano! Voltando ao assunto, acho que entendi essa relação entre o spin e Limite de Roche – https://pt.wikipedia.org/wiki/Limite_de_Roche . É isso ou falei besteira? Mesmo assim, se não envolver cálculos complicados que um leigo certamente não entenderia, no caso, eu, queria entender por que o spin alto permite uma órbita estável mais próxima do horizonte de eventos. Tem algo haver com a força centrífuga? Outra coisa que não entendi direito: para um observador externo que visse um astronauta mergulhar no BN, ele nunca caíria no horizonte de eventos, então uma imagem fantasma do astronauta ficaria congelada, embora ele já teria sido engolido. É isso ou entendi errado? Por que ser for, todos os corpos que o BN tivesse absorvido estariam pairando acima do horizonte de enventos, certo? Valeu pelas explicações e paciência.
Mercutiu, o limite de Roche é o mais perto de um objeto massivo que podemos chegar sem ser despedaçados pela força gravitacional do mesmo. Não tem muito a ver com a questão da órbita. Em termos mais simples a diferença é que no caso sem spin você fica em órbita equilibrando a atração gravitacional com a força centrífuga. No caso de um BN com spin a própria rotação do BN “arrasta” o espaçotempo ao redor dele, de modo que o próprio BN te dá um bocado de spin só por ficar perto dele. Assim você consegue ter mais força centrífuga e desse modo orbitar mais próximo do BN, isto é, com maior velocidade. Esse efeito do “arrasto” chama frame-dragging effect, e já foi medido no caso da Terra.
Com relação ao astronauta caindo, você está parcialmente correto. Como o tempo passa mais devagar perto do BN de fato alguém longe veria ele caindo cada vez mais devagar até ele congelar perto do horizonte, isso porque o horizonte é uma superfície onde “o tempo para” de acordo com quem está do lado de fora, então você nunca vai ver a luz que foi emitida lá. Por outro lado a luz é uma onda, então o tempo passar mais devagar implica que a frequência da luz diminui, como no efeito Doppler. Assim a queda do astronauta não só vai ficando devagar como também a imagem vai ficando mais avermelhada, até uma hora em que a luz emitida tem a frequência tão diminuída que está no infravermelho e você não consegue mais ver o astronauta. O momento que a luz vai pro infravermelho é o último momento que você enxerga o pobre coitado caindo. Então o efeito da dilatação temporal vem em duas partes: a) faz a queda passar cada vez mais devagar e b) faz o espectro da imagem ficar cada vez mais avermelhado. O segundo efeito acaba com a imagem depois de um tempo finito para a pessoa longe, então no final das contas não vemos os objetos que caíram mesmo. Agora se você tiver uma antena de rádio vai observar o que era luz agora como ondas de rádio, que tem menor frequência. De acordo com essa antena o astronauta continua mandando sinais, cada vez mais espaçados, até que ele fica mesmo pairando acima do horizonte. Eu sei que é meio complicado juntar os dois efeitos, mas dá uma pensada nisso e qualquer coisa me pergunta de novo
Oi, eu queria saber porque no primeiro planeta que eles visitaram as ondas eram tão altas e porque a amelia brand estava andando sobre a água..
Tbm queria saber, caso você puder explicar, porque a nave do ‘Mann’ (
Se não me engano) havia explodido. Porque não tinha oxigênio para haver explosão.
Ola Deborah,
No primeiro planeta, o da Miller, fica implícito que ele é coberto de água, mas no entanto é apenas uma camada rasa, ou seja a Amelia estava de fato de pé sobre o “fundo do mar”. Quanto as ondas, vamos por partes, que isso causou alguma confusão. Em primeiro lugar, precisamos entender a causa das marés aqui na Terra. A razão é que a força gravitacional da Lua, e em certo ponto do Sol também, não é exatamente uniforme ao longo do planeta. Isto é, a força é maior no lado da Terra mais perto da Lua e menor do lado mais distante. Conforme a Lua vai girando ao nosso redor essa diferença entre a gravidade ao longo do planeta causa uma atração não uniforme que provoca as marés. Quanto mais massivo o corpo que provoca as marés maiores são as ondas. Não surpreendentemente os físicos chamam esse fenômeno de forças de maré http://pt.wikipedia.org/wiki/For%C3%A7a_de_mar%C3%A9.
Esse não é o caso do filme. Acontece que as forças de maré regulam a velocidade orbital do corpo. Se você chegar muito perto de um corpo massivo as forças de maré “travam” você de modo que a sua órbita é sincronizada com a órbita do outro corpo, e assim você sempre está com o mesmo lado virado para o centro da órbita. Com isso não há variação da força gravitacional ao longo do objeto, e não temos marés. É o caso da Lua que sempre mostra a mesma face para a Terra. Então curiosamente a Lua provoca marés na Terra, mas a Terra não provoca marés na Lua. Esse é o caso do planeta da Miller, ele está muito próximo do buraco negro e está travado sempre com a mesma face virada para o BN. Então de onde surgem aquelas ondas? Acontece que no mundo real existem sempre outras coisas no universo, e por causa delas a órbita não é exatamente sincronizada. Quando a órbita não tem sincronia perfeita ainda não temos marés, mas o planeta vai sentir os efeitos das forças. Um exemplo disso é a lua Io de Jupiter que é sincronizada mas por não ser uma sincronia perfeita a gravidade de Jupiter provoca atividade vulcânica extrema em Io. Então (ufa!) uma explicação possível para as ondas gigantes é que elas seriam causadas por tsunamis devido a atividade vulcânica/tectônica enorme em um planeta tão próximo à um buraco negro.
Quanro a nave do Dr. Mann, de fato não havia oxigênio dentro da nave dele. Mas ele não acoplou corretamente com aquela nave em forma de anel. (Suponho eu que) ao tentar abrir a escotilha ele tenha causado uma ruptura na estrutura da outra nave. Como o filme menciona em uma cena anterior a estrutura da nave é essencialmente apenas alguns centímetros de alumínio e outros materiais, então uma ruptura qualquer pode levar a um dano estrutural enorme, até uma seção que continha oxigênio e aí explodiu tudo. Mas não lembro direito da cena do filme, posso estar enganado. Essa de fato é uma boa pergunta.
Obrigadaaa. Entendi *—*
Olá, Cesar! Primeiramente, parabéns pelo excelente artigo! Não sabia que o Kip Thorne tinha lançado um livro sobre a física do filme, vou caçá-lo agora. Meu comentário contém spoilers.
Eu não entendi direito como, ao cair no buraco negro, o protagonista tenha ido parar num hipercubo dentro de 5 dimensões. Creio que a 5a dimensão seja o tempo, mas obviamente desconsiderando que o Cooper fosse destroçado, uma vez que ele passasse pelo horizonte dos eventos, ele não seria “sugado” para o centro do buraco negro? O hipercubo (ou a realidade de 5 dimensões) ficava na singularidade? Primeiro pensei que ele pudesse ter passado por outro buraco de minhoca, já que no final ele é “ejetado” de volta para perto de Saturno, depois imaginei que fosse uma liberdade criativa dentro de outra, mas fiquei muito confuso depois hahaha
Abraços!
Ola Leonel, muito obrigado pelo comentário. Eu já pude ler o livro do Thorne sobre a ciência do filme, e posso dizer que é muito bacana. Ele certamente esclarecerá mais do que eu posso fazer em alguma linhas mas vou tentar dar um resumo da idéia do filme.
Segundo a premissa do filme o universo tem 5 dimensões. As 3 espaciais normais, cima-baixo, esquerda-direita, frente-trás, mais a 4 dimensão que é o tempo, isso está em perfeito acordo com a teoria da relatividade, mais uma quinta dimensão. Esta quinta dimensão é outra dimensão espacial a qual nós não temos acesso sensorial. É como se tivéssemos várias cópias do nosso universo quadridimensional, e a quinta dimensão nos permite ir para fora do nosso universo usual. Confuso, eu sei. Agora o hipercubo é essencialmente uma máquina desenvolvida pela humanidade no futuro. Segundo o filme a humanidade atinge um estado de desenvolvimento tecnológico de modo que consegue criar uma máquina que funciona até nessa quinta dimensão.
No filme o Cooper cai no buraco negro. Como esse BN é muito grande ele atravessa o horizonte de eventos sem nenhum problema. Só somos destroçados ao cair em BN pequeno mas massivo. Até aí tudo de acordo com a ciência como conhecemos. Uma vez dentro do BN o Cooper de fato encontra o hipercubo próximo a uma singularidade. Essa singularidade, pelo menos de acordo com o livro do Thorne, é de um tipo mais suave, não do tipo que destrói tudo. O importante é notar que o hipercubo vive em 5 dimensões, mas não o Cooper, então ele sempre fica em uma das “faces” tridimensionais do hipercubo.
Presumivelmente o Cooper consegue usar o hipercubo para acessar a quinta dimensão, e usa essa dimensão extra para sair do buraco negro. Isso quero notar que é completamente impossível de acordo com as leis da física, uma vez dentro de um buraco negro não existe modo de sair dele. Então essa parte é uma grande licença artística do filme.
De qualquer modo depois de sair do BN, viajar até a Terra para passar as informações para a Murph, o hipercubo por algum motivo resolve soltar ele perto de Saturno, embora não tenha nenhuma ligação óbvia disso com a existência do buraco de minhoca lá.
Espero que isso tenha ajudado
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