A “memeficação” da Ciência
Você aí, que acompanha blogs de divulgação, já se perguntou por que fazemos isso? Notoriamente pós-graduando e pós-doutorandos não são pessoas com muito tempo livre. Frequentemente falamos sobre temas que não são nossa especialidade, de modo que por detrás de cada post existem alguns dias matutando sobre o assunto, horas estudando para entender e muitas vezes falando com professores e trocando emails com alguém que faça pesquisa na área. Depois mais um tempo para pensar em como falar sobre o tópico evitando os detalhes técnicos sem deixar de ser honesto, e ainda o tempo para escrever de fato aqui. O que explica o intervalo, as vezes grande, de tempo entre um post e outro. Mas se dá tanto trabalho qual a motivação de tudo isso?
Antes uma pequena digressão. Olhe atentamente para o seu computador. Para a mesa que apoia ele. Para a caneca e o café dentro. Olhe para sua própria mão. Todas essas coisas são feitas de átomos. Carbono, oxigênio, nitrogênio, etc. Tudo com o que você interage diariamente é feita de objetos minúsculos idênticos, apenas arranjados de modo distinto e com enormes vazios entre eles.Você consegue olhar para sua mão e imaginar além do tecido, do sangue, das células e mitocôndrias, além do DNA e até os átomos, os pŕotons, nêutrons e elétrons, os quarks, o Higgs e (talvez) além. Um cético poderia duvidar de que isso fosse verdade quando posto assim.
Olhe para o céu azul do lado de fora da janela e o sol amarelo que ilumina tudo. Se você fosse para o espaço descobriria que o sol na verdade brilha branco (e portanto o superhomem deveria perder todos os seus poderes fora da atmosfera). No século XVIII o Lorde Rayleigh estudou como a luz, uma onda eletromagnética, se comporta ao interagir com objetos. Ele descobriu que quando o objeto é muito menor que o tamanho da onda a luz é muito sensível na interação. As menores ondas, como o azul, são muito espalhadas e as maiores ondas, como o vermelho, espalham muito pouco. Por outro lado quando o objeto é das mesmas dimensões da onda então o espalhamento ocorre igualmente, o branco continua mais ou menos branco. Da mesma forma se existem vários objetos de tamanhos variados a interferências entre os diferentes espalhamentos mantém a luz branca. Assim se o céu é azul é porque o ar é feito de pequenas partículas muito menores que o tamanho da onda da luz visível, ao passo que as gotículas de água das nuvens refletem uma cor branca. Então o azul do céu é (uma prova) um indício de que o mundo é feito de átomos.
Algumas pessoas leram o parágrafo anterior e acharam essa informação completamente irrelevante. Por outro lado, escrevi isso pensando que é realmente incrível que algo tão banal na nossa vida (como o céu ser azul) nos leve a uma conclusão tão profunda (a existência de átomos). Parece aquela sensação que temos quando descobrimos uma música ou uma banda nova e nos apaixonamos por ela. Na hora ficamos muito empolgados, escutamos várias vezes seguidas e queremos compartilhar com todo mundo esse sentimento.
Entendeu a resposta da primeira pergunta lá em cima? Acho que ficou claro que divulgação científica não é um hobby para nós, e sim algo que fazemos passionalmente. Não estamos aqui querendo ensinar nada para ninguém, mas sim dividir uma experiência que nós temos, algo que achamos profundo e que entristece ver quantas pessoas descartam como algo de caráter apenas prático e técnico.
No meio de divulgação somos frequentemente associados a outros tipos de páginas. Um tipo bem popular são os “memes de ciência”, como a página I ‘fuckin love science’. Não que haja algo de errado com isso, meramente que não se comunica ciência com uma imagem e um pouco de sarcasmo. Um dos valores de entender ciência é que o processo de entender é uma experiência transformadora, ele muda permanentemente o seu modo de se relacionar com o mundo a sua volta. Se existe alguma ironia real nesses memes é que não raramente as pessoas que ‘fuckin love science’ não se dão ao trabalho de procurar entender nada além das analogias mais simplórias, e muitas vezes errôneas. Elas nunca passam pelo processo de mudar a sua forma de ver o mundo.
Outro caso típico são páginas dedicadas ao ceticismo, aquelas que atacam astrologia, numerologia, etc. Em português a mais famosa é provavelmente o Universo Racionalista. Entenda bem, não temos nenhuma simpatia pelos diversos “gurus” e congêneres, mas existe uma diferença muito grande entre ceticismo e ciência. Nós não temos a pretensão de separar o mundo em verdades e mentiras, estamos apenas tentando compartilhar certas coisas que aprendemos. Essa é a diferença entre ceticismo e ciência, o primeiro vê o segundo apenas como um instrumento. Para eles o que importa é um resultado ou outro e não o que aquilo significa. Não surpreendentemente as páginas de ceticismo costumam interpretar equivocadamente experimentos e teorias.
O que está por trás de páginas como essas é o despreparo e o descompromisso com o que nós acreditamos ser divulgação científica. Escrever sobre ciência vai muito além de reproduzir uma notícia. O processo que descrevemos no início, de aprendizado e reflexão na hora de escrever um texto, nos transforma e é uma experiência enriquecedora. No fim, é isso que tentamos transmitir para nossos leitores. Não importa quantas pessoas leram ou deixaram de ler, mas se pelo menos um leitor agregou algo com a leitura que não será esquecido 30 segundos depois.
Podemos observar que a ciência (em particular, a física) ganhou um certo hype nos últimos tempos devido à notícias sensacionalistas – que se espalham rapidamente devido as redes sociais – e ao seriado “The Big Bang Theory” – que mostra uma vida acadêmica infinitamente mais tranquila que a realidade. Apesar do efeito positivo de aumentar em massa o interesse e o contato com a física de fronteira, observa-se o nascimento de uma geração de pseudocientistas por conta de uma certa banalização do ‘fazer ciência’. Hoje em dia, a informação é abundante e de fácil acesso, com um clique você pode ler um livro técnico sobre ‘Teoria Quântica de Campos em Espaços Curvos’, um artigo curto dizendo o que o Hawking falou ou deixou de falar na semana passada ou um texto científico voltado para leigos. A contrapartida é que algumas pessoas aprendem o jargão, as palavras-chave de alguma área, e automaticamente começam a se portar como especialistas. Como se isso não bastasse, esses focos de desinformação atraem uma multidão que também só buscam o hype de compartilhar uma equação bem complicada em uma imagem do Facebook e que se esquece que o aprendizado é consequência de muito esforço e dedicação.
E qual é a moral dessa história? Existe uma diferença entre saber o que é verdade e por que algo é verdade. Divulgação deveria ser sobre a segunda e não sobre a primeira. Outros podem fazer diferente, mas, para desencargo de consciência, nós não apoiamos esse tipo de postura nem concordamos com a “memeficação” da divulgação científica e outros congêneres que usam de sarcasmos para atacar o que discordam ao invés de falar sobre o que concordam.
Acho que, quanto a essa coisa do ceticismo, o problema é que, em geral, as páginas que se nomeiam céticas pouco sabem acerca do ceticismo como corrente filosófica. Elas apenas tem algum conhecimento geral de ciência e filosofia, entendendo como ceticismo certa atitude crítica quanto à obscurantismos. Confrontar pseudociências é dever de quem trabalha com conhecimento, mas isso não faz de ninguém sábio, nem conhecedor da ciência e da racionalidade que defende.
Texto sensacional. De certa forma, um tipo de “desabafo”, a meu ver, que reflete em muito o atual quadro do papel da Ciência nas redes sociais e internet, no geral.
http://www.saberastronomia.com.br
Algumas evidências sobre qual caminho os divulgadores de ciência devem seguir caso se interessem pelo avanço do conhecimento científico e progresso humano.
Ou seja, ensinar apenas fatos científicos para leigos, como é sugerido pela autora, não ajuda a combater as mazelas intelectuais da nossa sociedade e muito menos no progresso científico. Porém, o ensino do método científico e, principalmente, o ceticismo são a chave para um futuro promissor.
Victor,
primeiro de tudo, acho que você não entendeu direito o texto. A Camila diz explicitamente (inúmeras vezes na verdade) que divulgação não é sobre ensinar fatos, e sim explicar porque os fatos são verdadeiros. É explicar como as pessoas chegaram àquelas conclusões e como isso se encaixa na visão de mundo como um todo.
Segundo, o vídeo (que por sinal tem uns pontos interessantes) fala várias coisas, das quais eu concordo em partes, mas em especial afirma que a divulgação deveria se focar em falar de método científico, ceticismo, falseabilidade, e não sobre a ciência em si. Fora o fato da aparente contradição de termos (divulgação científica não deveria falar de ciência), ele levanta aponta como evidência disso alguns estudos que mais conhecimento de ciência não correlaciona positivamente com desacreditar em pseudociência. Vamos aos estudos:
1) No primeiro paper o “punchline” é que entre os pais que se recusaram a vacinar os filhos a mãe tinha maior proabilidade de ter curso superior completo. Se você entrar lá no artigo e ler a tabela 3 vai descobrir que isso ignora a margem de erro. Incluindo a margem de erro a afirmação (correta) é de que entre as mães com curso superior completo existe a maior probabilidade de ou se recusar ou de garantir a vacinação dos filhos. De fato a única conclusão possível desse estudo (de nodo de acordo com a tabela 3) é de que a menor porcentagem das pessoas que de fato vacinaram os filhos está entre mães que em algum momento abandonaram ou o colégio ou a faculdade. Honestamente a única coisa real a se concluir desse artigo é que os autores são completamente ignorantes sobre análise estatística.
2) No segundo artigo os autores analisaram dois grupos, estudantes de filosofia e de biologia, procurando correlação entre fazer ciência e desacreditar em pseudociência. Pois bem, não viram nenhuma correlação. Por outro lado eles notaram que todos os entrevistados tinham conhecimentos precários de física. Obviamente a implicação é que precisamos ensinar mais física para os biólogos.
3) No terceiro eles entrevistaram alunos que fizeram um curso de astronomia durante a graduação e fizeram perguntas de pseudociência e descobriram que muitos deles acreditavam em fantasmas e alienígenas. Só esqueceram de mencionar que fizeram isso na Universidade do Arizona, um dos estados mais conservadores dos EUA. Como o vídeo mesmo menciona (não verifiquei e estou confiando nisso) ideologia política correlaciona com esse tipo de coisa. Quando você vê isso o resultado é zero surpreendente. Por sinal a despeito disso a taxa de pessoas que acreditavam em astrologia era bem pequena. A conclusão é de que não basta estudar uma área da ciência, precisa ser bem informado de todas.
Espero que tenha ficado claro que nenhum desses estudos apoia essa conclusão de que aprender ciência é irrelevante. Na verdade eles só me mostram o quão porcaria é o entendimento de estatística entre certos estudiosos.
Honestamente me parece que essa comunidade de ceticismo usa esse discurso de não aprender ciência justamente como desculpa para não estudar ciência e ficar só lendo uns filósofos. Entre o físicos e matemáticos (as pessoas com que tenho contato) esses filósofos como Mario Bunge, Karl Popper (e seus sucessores), etc, são completamente ignorados, justamente porque eles ficam falando sobre o que é fazer ciência quando nunca fizeram ciência e acabam tendo visões completamente distintas da nossa do que é o dia-a-dia de um cientista.
O cara no vídeo (que de novo, falou várias coisas interessantes) pode achar que não é importante falar de fatos científicos, mas quando eu vejo o Douglas do Universo Racionalista, uma das maiores páginas de ceticismo, falando na Campus Party que neutrinos não são observáveis eu sou forçado a discordar. Na falta de um foram 3 prêmios Nobel por descobertas experimentais (observações diretas) de neutrinos. E isso sim é que me preocupa na divulgação.
Oi Cesar,
Acredito que a posição do “cara do vídeo”(Pirulla) não seja a de que ensinar fatos científicos seja inútil ou não importa. Até porquê seria uma tremenda hipocrisia da parte dele, visto que no próprio canal tem vídeos que falam exclusivamente sobre fatos científicos (inclusive um de 40 minutos somente sobre cladística).
A questão é a seguinte: como fazer as pessoas que não acreditam na ciência (pois essas pessoas ainda existem) acreditarem e aceitarem os fatos? Se você apenas divulga o resultado, a pessoa dificilmente aceita na hora. Dizer somente que “o céu é azul é uma evidência da existência de átomos” ou “todos os animais tem um ancestral comum” não basta, e não deveria bastar mesmo, ninguém é obrigado a acreditar em algo sem provas. É preciso explicar como se chegou ao resultado, ou seja, o método científico. Nisso, o texto e seu comentário estão de acordo e certíssimos. Quando você analisa os estudos citados no vídeo é isso que está fazendo, avaliando o método científico neles aplicado (no caso, os cálculos estatísticos). É preciso saber o porquê das coisas, não somente as coisas.
A “comunidade de ceticismo” tenta mostrar às pessoas um modo de identificar se alguma coisa dita por alguém está próxima da realidade ou não. Isso acaba se relacionando intimamente com a tarefa dos filósofos da ciência. Eles procuram justificar a razão pela qual a ciência é uma boa forma de descrição do universo, e nisso contribuem com princípios, métodos e critérios segundo os quais obtêm-se uma boa descrição.
O ceticismo faz parte do método científico. É por causa do pensamento cético que se desenvolvem modos de experimentar as hipóteses. Se não, logo a primeira explicação já satisfaria as nossas necessidades de explicar um fenômeno. Por exemplo: hipótese: a gravidade acelera os corpos de acordo com suas massas. Se ninguém tivesse “duvidado” um pouco dessa hipótese, ainda acreditaríamos nela. Porém, já foram feitos inúmeros experimentos que derrubaram essa hipótese, os corpos aceleram igualmente independente de suas massas. Ceticismo não é rejeitar todas explicações, é avaliar as explicações e hipóteses e acreditar nelas quando mostradas provas o suficiente.
Enfim, a mensagem que quero passar, e acredito que todo bom divulgador científico também queira, é a seguinte: conhecer os fatos da ciência é fundamental, e TAMBÉM devemos conhecer e saber porquê esses fatos são coerentes e como foram feitas essas conclusões.
Recomendo aqui o último livro do Carl Sagan (um dos maiores divulgadores científicos do século XX, se não “O” maior): “O mundo assombrado pelos demônios”, em que ele discorre justamente sobre este tema.
Se você souber ler inglês, tem dois textos recentes (um da Scientific American e outro da National Geographic) que debatem o porquê de acreditarmos no que acreditamos:
http://www.scientificamerican.com/article/why-people-fly-from-facts/
http://ngm.nationalgeographic.com/2015/03/science-doubters/achenbach-text
Acho extremamente válida a crítica ao sensacionalismo de certos sites de divulgação científica. Não somente sites, mas também revistas de circulação no país (Mundo Estranho, Super Interessante, e até as que não têm a divulgação científica como atividade principal, Veja, Época…), muitas vezes pecam em explicações simplistas e mal colocadas sobre pesquisas científicas. Pessoalmente, parei de ler o I Fucking Love Science depois de notar esse sensacionalismo com o intuito de atrair mais leitores na maioria de suas postagens.
Essa memeficação é desnecessária e prejudicial, concordo. Porém, a crítica aos “sites de ceticismo” me pareceu direcionada ao pensamento cético. Quando o texto diz “Essa é a diferença entre ceticismo e ciência, o primeiro vê o segundo apenas como um instrumento”, discordo completamente: é a ciência que usa o ceticismo. A impressão que a frase citada passa é que o ceticismo tem um objetivo final e que a ciência é seu caminho para chegar a ele, quando o ceticismo não tem nada a concluir, é apenas um modo de pensar.
Se você leu até aqui, obrigado, e espero que aceite bem os meus comentários e críticas. Tenhamos em mente que os nossos objetivos são os mesmos: a divulgação das descobertas que a ciência nos proporciona e o reconhecimento de tais fatos como úteis para o aprimoramento de nossas vidas e de nossa visão do universo por toda a sociedade.
Daniel,
obrigado pelo comentário. Mas acho que você não compreendeu o que quis dizer. Quando dizemos que “o céu é azul é uma evidência da existência de átomos” você coloca o ponto que “ninguém é obrigado a acreditar em algo sem provas”, mas não entendeu o cerne da questão. A pergunta é “como sabemos que o universo é feito de átomos” e a resposta é que o céu azul é prova de que átomos existem. Se olhar o terceiro parágrafo do texto ele dá uma descrição de como o Lord Rayleigh estudou essa questão e concluiu a necessidade de que átomos existam para que o céu seja azul. O ponto todo do texto é que em divulgação não basta dizer que “pesquisador X chegou a conclusão Y”, e sim explicar como ele chegou a conclusão baseado nos fatos. O método científico fica implícito quando o leitor entende que o pesquisador se apoiou em fatos bem estabelecidos para chegar a uma nova conclusão. Mas usualmente as páginas que citamos, bem como as revistas que você bem lembrou, e os canais de TV a cabo dos quais o “Pirulla” falou, apenas passam a resposta junto com uma explicação mal elocubrada. Se perceber fizemos questão nesse texto, com o caso da exitência de átomos, de descrever a linha de raciocínio por detrás do fato. Não estamos pedindo que o leitor acredite sem evidências, estamos fornecendo as evidências a menos dos detalhes técnicos.
Quanto ao ceticismo, vejo agora que de fato o texto parece ser (em parte) uma crítica ao pensamento cético (científico), embora não tenha sido nossa postura consciente. No entanto acho justo dizer que ele contém uma crítica velada à filosofia da ciência. Me explico com um exemplo: no texto da National Geographic um dos casos contados é o do Galileo, que ao propor que a Terra girava em torno do Sol não apenas desafiou os dogmas da igreja como também o senso comum. Pois bem, quais eram as evidências do Galileo? Nenhuma! De fato, a única forma de provar que a teoria heliocêntrica é verdadeira é medindo a mudança na posição relativa das estrelas em função do movimento da Terra (expliquei sobre isso aqui https://truesingularity.wordpress.com/2012/10/08/e-no-entanto-ela-se-move/). Mas as estrelas estão tão distantes que na época de Galileo ninguém conseguiu medir. Os registros do julgamento do Galileo ainda existem e comprovam que quando confrontado com essa questão durante o julgamento ele não pode oferecer resposta. Foi só mais de duzentos anos depois que o Bessle mediu a paralaxe confirmando o heliocentrismo. Essencialmente foi o pesamento cético (científico) que derrubou o Galileo no julgamento.
Esse é um exemplo de como questões como falseabilidade não retratam corretamente o desenvolvimento da ciência (como também argumentei aqui https://truesingularity.wordpress.com/2012/09/13/falseabilidade-e-falsidades-em-filosofia-das-ciencias/). O incômodo com a enfase na filosofia da ciência é justamente originário de o quão distantes estão as caracterizações dos filósofos da atividade científica vivida por nós. Se me permite a rudeza, quando um filósofo da ciência me diz o que é o método científico eu me sinto como se um padre estivesse tentando me explicar sobre sexo. Me permita então discordar, o ceticismo não é parte do método científico, ele é, como você apontou, um modo de pensar não necessariamente correlato com a prática científica. Justamente o fato de o ceticismo não ser necessário nem suficiente ao método científico que levou o Feyerabend a concluir (erroneamente) que o método não existe. Ao reduzir a (complexa) prática da ciência a alguns conceitos os filósofos cometem erros grosseiros devido ao fato que vivem em suas torres teorizando sobre o que não tem contato direto. Se me permite uma nova rudeza, é uma cagação de regra desnecessária.
E justamente por não refletir corretamente o método científico que o ceticismo é prejudicial a divulgação científica. Pois ele ilude os leitores a reduzir a ciência a um conjunto simples de regras e os desprepara para entender as controvérsias atuais, como o aquecimento global, por exemplo.
Espero que perdoe o meu tom se passei das normas de civilidade, e aceite também os meus comentários. Quero dizer que respeito sua opinião distinta sobre o papel do ceticismo e o encorajo a sempre nos criticar quando achar pertinente. Quero só enfatizar que concordo no que imagino ser o seu ponto principal, não são apenas os fatos, mas os porquês que são importantes
“Douglas do Universo Racionalista, uma das maiores páginas de ceticismo, falando na Campus Party que neutrinos não são observáveis eu sou forçado a discordar. Na falta de um foram 3 prêmios Nobel por descobertas experimentais (observações diretas) de neutrinos. E isso sim é que me preocupa na divulgação.”
Não sei se é preguiça ou perseguição mesmo, mas na palestra eu me referi as coisas que não podem ser observadas diretamente sem instrumentalização.
Nossa, então é pior ainda, significa que não estou observando diretamente essa tela de computador porque estou usando óculos.
“Nossa, então é pior ainda, significa que não estou observando diretamente essa tela de computador porque estou usando óculos.”
Reductio ad absurdum.
Se você não quer falar dos neutrinos tudo bem, então podemos falar de todas as merdas de Teoria das Cordas que você falou na mesma palestra.
“Se você não quer falar dos neutrinos tudo bem, então podemos falar de todas as merdas de Teoria das Cordas que você falou na mesma palestra.”
Pelo tom do diálogo, deu pra ver como vocês são bons “educadores científicos”.
A gente só educa quem quer ser educado.
Estou vendo agora quem é arrogante e prepotente.
Douglas,
Primeiro de tudo, ninguém, em momento algum, explicitamente ou implicitamente, o acusou de ser arrogante e/ou prepotente, então me surpreende a sua postura defensiva. Por favor tenha isso em mente, e mantenha uma certa compostura nos comentários aqui.
Em segundo lugar, o texto é uma crítica a inúmeros erros em relação a física que aparecem regularmente no I Fuckin Love Science e no Universo Racionalista, bem em com sua apresentação no Campus Party. Não entendo o motivo de você se sentir perseguido, se procurar no nosso blog encontrará inúmeras críticas aos veículos usuais de comunicação, como a Folha de São Paulo. Inclusive o tom do texto foi muito mais brando em relação aos que criticam a Folha justamente porque discutimos o fato de que você não é mal intencionado, apenas imaturo e deseducado cientificamente.
Em terceiro, entendo o seu interesse por filosofia e que queira falar sobre isso não me incomoda, mas aconselho que pare de falar de física, pois você é completamente ignorante do assunto. A despeito do que diz, no Campus Party você disse que neutrinos não são observáveis sem qualificar em momento algum a palavra “observável”. E se quis subentender a presença do instrumento é mais infeliz ainda da sua parte, pois tal qualificação é injustificada e patética do ponto de vista da física. Ainda no mesmo evento ao falar de teoria de cordas você confundiu parâmetros livres com o problema de Landscape, conceitos completamente distintos e que poderia aprender lendo a wikipedia.
Se você é um filósofo então fale de filosofia, mas falar sobre o que não sabe é socialmente irresponsável. Traduzir textos de terceiros não faz do UR uma página de ciência, nem faz dos autores entendidos do assunto. Você diz que se preocupa com o significado das coisas, mas nunca lhe ocorreu que para entender significado é necessário entender as equações? Tenho certeza que me censuraria se eu resolvesse falar de Mario Bunge baseado apenas em textos de outros, por que então não está aberto a críticas de que nunca leu um artigo do Hawking?
“Primeiro de tudo, ninguém, em momento algum, explicitamente ou implicitamente, o acusou de ser arrogante e/ou prepotente, então me surpreende a sua postura defensiva.”
Aqui não mesmo, mas a Camila já disse que sou prepotente e, não só ela como você também demonstrou arrogância nos comentários. Você usou um típico exemplo da falácia Reductio ad Absurdum para reduzir o meu argumento ao ridículo. Usou também a típica falácia do espantalho para dizer que errei ao falar que “neutrinos não podem ser observados”, uma vez que estava de coisas não observáveis diretamente, ou seja, coisas que não são passíveis de observação direta. O termo “observação direta”, ao menos em filosofia, é usado para se referir as coisas que podem ser observadas diretamente sem instrumentalização.
“Em segundo lugar, o texto é uma crítica a inúmeros erros em relação a física que aparecem regularmente no I Fucking Love Science e no Universo Racionalista, bem em com sua apresentação no Campus Party.”
Não, o autor apenas adotou relativismo mascarado de crítica construtiva para argumentar contra a importância do ceticismo na ciência e, pior ainda, usando como base anedotas.
Trecho:
“Nós não temos a pretensão de separar o mundo em verdades e mentiras, estamos apenas tentando compartilhar certas coisas que aprendemos. Essa é a diferença entre ceticismo e ciência, o primeiro vê o segundo apenas como um instrumento.”
E continuou:
“Não surpreendentemente as páginas de ceticismo costumam interpretar equivocadamente experimentos e teorias.”
Fica até difícil saber qual é o seu alvo: é o ceticismo ou a filosofia da ciência?
“Em terceiro, entendo o seu interesse por filosofia e que queira falar sobre isso não me incomoda, mas aconselho que pare de falar de física, pois você é completamente ignorante do assunto.”
O que define como “ignorante”? Alguém que comete alguns erros sobre física ou alguém que não faz graduação em física? Aliás, por que eu não posso falar de física? Tem que ter vivência em física para falar sobre física? Você não é filósofo e escreve textos sobre filosofia da ciência falando o que também não sabe e agora? O texto “Falseabilidade e Falsidades em Filosofia das Ciências” foi uma das coisas mais absurdas que eu já li sobre filosofia da ciência e, pra piorar, o texto acaba citando Thomas Kuhn e Paul Feyerabend (dois irracionalistas, sendo um anticiência, que comparava a ciência aos mitos).
“A despeito do que diz, no Campus Party você disse que neutrinos não são observáveis sem qualificar em momento algum a palavra “observável”. E se quis subentender a presença do instrumento é mais infeliz ainda da sua parte, pois tal qualificação é injustificada e patética do ponto de vista da física.”
Quem está errado aqui é você, não cometi erro algum ao falar sobre neutrinos, eu até poderia usar o mesmo exemplo com átomos que a ideia seria a mesma. Em filosofia, usamos “observações diretas” para se referir àquelas que podem ser acessíveis sem instrumentalização. No livro que tomei como base, Bunge, que é físico, usa “átomos” como exemplo (BUNGE, Mario; La Ciencia, Su Método y Su Filosofía).
“Ainda no mesmo evento ao falar de teoria de cordas você confundiu parâmetros livres com o problema de Landscape, conceitos completamente distintos e que poderia aprender lendo a Wikipedia.”
Posso ter cometido algum erro sim ao falar de Teoria de Cordas, nisso eu concordo com você, pois não me preparei bem para falar sobre o assunto e, tomei como base apenas dois textos que escrevi junto com um amigo (da UFRJ) que já trabalhou com algo envolvendo a Teoria de Cordas (ambos os textos estão no Universo Racionalista).
“Se você é um filósofo então fale de filosofia, mas falar sobre o que não sabe é socialmente irresponsável.”
Por favor, eu nunca disse que sou filósofo. E sua afirmação é tão patética que poderia também usada contra você da seguinte forma:
“Se você é um físico então fale de física, mas falar sobre o que não sabe é socialmente irresponsável.” (Isto depende do que você considera o que seria um meio válido para ter certeza do que é certo o que você considera saber.)
“Traduzir textos de terceiros não faz do UR uma página de ciência, nem faz dos autores entendidos do assunto.”
O Universo Racionalista é uma página de ciência, você gostando disso ou não, ela continuará sendo.
“Você diz que se preocupa com o significado das coisas, mas nunca lhe ocorreu que para entender significado é necessário entender as equações? Tenho certeza que me censuraria se eu resolvesse falar de Mario Bunge baseado apenas em textos de outros, por que então não está aberto a críticas de que nunca leu um artigo do Hawking?”
Aqui é mais um comentário repleto de espantalhos, pois eu estudo filosofia da física, que é uma área que lida diretamente com interpretações da física e, também eu nunca censurei ninguém para falar sobre Mario Bunge ou qualquer outro cientista. Sua acusação final beira o ridículo.
Conheço pessoas sérias que fazem filosofia da ciência, e estas são treinadas em física desde graduação até pós-graduação. Se feita corretamente, é uma área bastante complexa e é uma pena que sofra tanto preconceito por parte dos físicos (talvez pelo tanto de crackpots que estão na área?).
Agora com todo respeito, filósofo da física que não entende física de uma maneira profunda é igual a crítico de literatura que não sabe ler. Não é maldade, é um simples fato.
“Agora com todo respeito, filósofo da física que não entende física de uma maneira profunda é igual a crítico de literatura que não sabe ler. Não é maldade, é um simples fato.”
Concordo totalmente, por isso, estou tentando voltar para física, mas estou na lista de espera. No ano passado, cheguei a cursar física rapidamente na UFSCar, mas infelizmente tive que abandonar a graduação por problemas financeiros.
“O que define como “ignorante”? Alguém que comete alguns erros sobre física ou alguém que não faz graduação em física? Aliás, por que eu não posso falar de física? Tem que ter vivência em física para falar sobre física? Você não é filósofo e escreve textos sobre filosofia da ciência falando o que também não sabe e agora? O texto “Falseabilidade e Falsidades em Filosofia das Ciências” foi uma das coisas mais absurdas que eu já li sobre filosofia da ciência e, pra piorar, o texto acaba citando Thomas Kuhn e Paul Feyerabend (dois irracionalistas, sendo um anticiência, que comparava a ciência aos mitos).”
É claro que tem que ter vivência em física para se falar em física. Deixe-me fazer uma analogia, uma pessoa que não entende de mecânica não pode consertar carros, ou falar sobre como se conserta carros. Não precisa ter o título de físico para se falar de física, mas é preciso estudar física. Se alguém fala de uma coisa que não entende está cometendo uma impostura intelectual.
Dogulas,
Como você insiste em se sentir perseguido e acreditar que existe algo pessoal estou temporariamente suspendendo seus comentários. Mas esclareço novamente, o texto não fala nem sobre filosofia da ciência nem ceticismo diretamente, mas sim sobre sua inclusão na divulgação científica.
O seu estado de desequilíbrio emocional está afetando seu julgamento, quando me referi a ser “ignorante” quis dizer, como o Fernando Martins corretamente entendeu, que não se tem contato direto com o assunto, possuir uma graduação ou não é além do ponto. Nesse sentido me dou ao direito de comentar sobre as aplicações de filosofia em física dado que li a obra de todos os autores citados, ou seja tenho conhecimento em primeira mão do que afirmaram. É essa a diferença que tentei fazer, e não era para ser tomada como insulto como você tão apressadamente o fez.
Em uns dias retiro a suspensão se você quiser conversar quando estiver mais calmo.
Devo admitir que é um pouco desanimador ver pessoas interessadas em ciência ter tal conceito sobre detecção direta. Ora, detectar algo por conta de interação fraca, forte, gravitacional ou eletromagnética a priori é igualmente válido, não há distinção entre uma onda eletromagnética cujo comprimento se encontra no espectro visível ou infravermelho, por exemplo. Não obstante de tais falácias, vejo a divulgação fantasiosa crescendo hodiernamente. Cada vez mais, é difícil averiguar de imediato a confiabilidade de uma fonte. Vale ressaltar que poucos meses cursando física não te propiciam entender aspectos elementares de Relatividade Geral, Quântica, Partículas e Cordas.
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Cara ,meu velho!você falou tudo !!!mas aquele “……..metido do Douglas Rodrigues”….,do universo racionalista ,esta neste momento fazendo conjecturas sobre suas palavras ,e é detestável não se ter uma replica sua a respeito ,estou repassando seu post a amigos q acredito concordem com você,abraço e aguardo novos post.
Clilton, obrigado pelo comentário. Pessoalmente achei a réplica do UR muito simples e não imaginei se fazer necessário um comentário, mas se insiste posso falar minhas impressões.
Aparentemente o UR se sentiu injuriado quando dissemos que o UR é provavelmente a página mais famosa em português de ceticismo. Isso foi baseado nas impressões das pessoas que fazem parte do nosso círculo de amizades, e não derivada de uma afirmação categórica nesse sentido. Se não são uma das mais famosas, tudo bem, perdão pelo erro. A resposta também afirma que o texto é “apenas um disfarce de uma crítica destrutiva”. Acho que não disfarçamos ao nomeá-los explicitamente, assim como foi explícita a crítica do I Fuckin Love Science e seus congêneres.
O UR ainda afirma que não é uma página de ceticismo, e sim de filosofia e ciência. Se você tiver saco de ler minha resposta ao Daniel acima eu retifiquei a situação ao afirmar que a crítica se dirige ao enfoque em filosofia da ciência em geral, e ceticismo em particular, de páginas como o UR, em desprezo de falar sobre ciência de verdade. Eu não vou falar pela Camila, mas em minha opinião filosofia da ciência fala sobre o que não entende e por isso esse tipo de coisa não é divulgação científica.
O texto do UR ainda diz sobre fatos cienticos que “Importa também o que aquilo realmente significa(…)”. O problema é a palavra “realmente”. Veja bem o caso da mecânica quântica: este é uma teoria que lida com certos aspectos, em generais microscópicos, de fenômenos físicos. Se procurar um pouco na internet vai descobrir que existe uma certa controvérsia sobre a “interpretação da mecânica quântica”. O ponto é que todas as “interpretações” são equivalentes, pois nenhuma é diferente da outra em relação as explciações dos fenômenos. Assim a teoria da mecânica quântica dispensa essas tais “interpretações”, não existe um significado “real” por trás dela. Entender mecânica quântica necessariamente requer entender que só podemos descrever os fenômenos corretamente, não é possível atribuir significado a eles.
Enfim, eu não tomei de modo algum como ofensivos os comentários do texto do UR. Nem pretendo dizer o que eles devem ou não devem fazer. Acho que o nosso texto só afirma que o que o UR faz e o que a gente faz é muito diferente, e só um deles é divulgação científica.
E COSMOS?? 😦
Edinaldo,
suponho que esteja se referindo a série Cosmos, ou a o original com o Carl Sagan ou a mais recente com Tyson. Sinceramente nunca assisti nenhuma das duas, mas dado que me falaram muito bem da primeira eu daria o benefício da dúvida. Certamente essa série não estava na minha cabeça quando escrevi o texto. Por outro lado muitos canais como a Discovery passam programas que não chegam perto de ser divulgação, a despeito de temas “científicos”. Alguém colocou um link pro vídeo do Pirula ali em cima caso você queria ver. Minha opinião é mais ou menos a mesma.
Abraços
Olá Cesar…correto, me refiro a estas duas séries.
Acredito que a primeira, com o Carl Sagan, nos levava a refletir e observar mais alguns detalhes simples, que por vezes eram soluções para grandes problemas, ou seja, nos proporcionava o aprendizado de um raciocínio mais crítico sobre tudo que nos rodeia.
Já a segunda série, com o Tyson, senti que foi algo mais “direto”, que posteriormente percebi muitas simplificações de alguns assuntos (acredito que para o bom andamento da série).
Sou astrofotografo amador, mas gosto de conhecer um pouco sobre nosso universo, após estas séries, resolvi investir em alguns livros e curso de astronomia básica, livros sobre astrobiologia, livros do Stephen e estou fazendo aquele curso online da USP e do observatório nacional, mesmo assim, ainda não me considero nem astrônomo amador.
Mesmo assim, ainda achava que possuía um conhecimento um pouco mais avançado que a maioria (sobre astronomia e cosmologia), mas diante deste texto, sinto que posso estar apenas incluso nessa “modinha nerd”, não sei…espero que não.
Estou vendo a possibilidade de cursar física, para adquirir conhecimentos mais sólidos, é um projeto, vamos ver se vai para frente.
O texto está correto, é bom, mas não sei até que ponto ele pode desestimular possíveis futuros astrônomos…
Abraço,
Edinaldo
Edinaldo,
Eu realmente não vi nenhumas das séries Cosmos, mas andei conversando com pessoas em quem confio e elas me garantiram que a produção é boa e as explcaições confiáveis. Certamente o que falei no texto não se aplica a elas.
Segundo, a minha crítica se dirigia às pessoas que só consomem ciência na forma de pequenos documentários e imagens do facebook, o seu caso, de quem já leu livros e fez cursos online é completamente diferente. Eu diria que com certeza você não está incluso em modinha alguma, quem tá na modinha não faz esforço como você.
O ponto principal é que ao se interessar por ciência a pessoa deveria agir ativamente atrás disso, buscar livros, etc, e não só receber informações passivamente. Não precisa também se preocupar em fazer curso de graduação em física nem nada, cada um sabe os objetivos que tem e nem sempre o caminho passa pela graduação. Você que tem que saber até que ponto quer se formar, não necessariamente de modo formal.
Espero que o texto não desencoraje ninguém, na verdade eu diria que é mais ou menos uma afronta para ver se as pessoas tiram a bunda do sofá, e levem a bunda pra cadeira, de frente para um livro.
Continue perseguindo seus interesses, acho que está num ótimo caminho
Abraços
Olá Cesar, entendi mais claramente seu ponto de vista, realmente algumas pessoas só querem informações “mastigadas”, e isso é para tudo.
Obrigado pelas palavras e incentivo…grande abraço!
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